Lesbicas também são mães
A Associação Clube Safo, a Associação ILGA Portugal e o coletivo PMA para Todas estão solidárias com as famílias LGBTI+ (nomeadamente as constituídas por lésbicas) em Itália e com as Organizações Não Governamentais de Direitos LGBTI+ neste país, incluindo a Famiglie Arcobaleno, manifestando uma profunda preocupação e repúdio em relação à decisão do Ministério Público italiano de ordenar a retirada do nome de mães não-biológicas das certidões de nascimento de crianças filhas de casais do mesmo género e de ilegalizar estas e todas as futuras famílias.
Essa medida representa um retrocesso alarmante nos direitos das famílias LGBTI+ e uma violação do princípio de igualdade perante a lei. Após a conquista da igualdade nas uniões civis entre pessoas do mesmo sexo em 2016, o espectável, num país democrático, seria o reconhecimento e a proteção dos direitos parentais de casais constituídos por pessoas do mesmo sexo se desenvolvessem progressivamente. No entanto, a atual decisão do Ministério Público italiano vai em sentido contrário, ameaçando a segurança jurídica, física e emocional de famílias que há vários anos lutam por reconhecimento em toda a sua diversidade.
Reconhecer mães não-biológicas e pais não-biológicos, assim como todas as pessoas cuidadoras de crianças, é uma questão fundamental para a proteção dos direitos e bem-estar das crianças em famílias homoafetivas. Essa decisão representa uma negação da sua realidade, identidade familiar e existência concretas, causando potenciais danos psicológicos às crianças e afetando a segurança destas famílias.
Além disso, a proibição do acesso a técnicas de procriação medicamente assistida para casais de pessoas LGBTI+ (em específico mulheres e lésbicas) e a recusa em permitir a adoção plena são políticas altamente discriminatórias. O direito a constituir família é um direito fundamental e não deve ser negado com base na orientação sexual, identidade ou expressão de género.
Essa decisão do Governo e Ministério Público italianos é um exemplo alarmante do retrocesso de direitos enfrentado por comunidades LGBTI+ – e outras tido como minoritárias – sob governos que não priorizam a igualdade, a diversidade e a inclusão e advogam o ódio, o medo e a violência.
O retrocesso de direitos tem sido historicamente impulsionado por governos que defendem a ideia de proteção da chamada “família tradicional” e o fim da inventada “ideologia de género”. Através de um viés conservador e discriminatório, tais governos frequentemente perpetuam a exclusão e a marginalização de famílias LGBTI+, usando esta exclusão para reforçar ainda mais os privilégios sociais já instalados. Há espaço e lugar para todas as famílias e não será certamente criando contextos de alta fragilidade e insegurança para umas que se reforça a legitimidade de outras. Família é isso mesmo, família independentemente de género, orientação sexual ou biologia e todas as famílias têm de ser reconhecidas.
É crucial compreender que a proteção da constituição de famílias homoafetivas é, na realidade, uma salvaguarda essencial para a segurança e o pleno desenvolvimento das crianças. Importa desmascarar, contestar e desconstruir argumentos falaciosos que podem surgir em defesa de retrocessos legislativos semelhantes, inclusive em Portugal.
Infelizmente, ao longo dos últimos anos, temos testemunhado um ressurgimento de políticas opressoras e discriminatórias em várias partes do mundo, e cada vez mais na Europa. Esse tipo de abordagem, que desconsidera o progresso alcançado no reconhecimento dos direitos das pessoas LGBTI+ e das suas famílias, coloca em risco a dignidade e a segurança de milhões de pessoas. É crucial que as democracias modernas protejam e promovam os direitos humanos universais, independentemente de qualquer característica identitária, de modo a construirmos sociedades mais justas, inclusivas e respeitosas da diversidade humana. A luta contínua contra este retrocesso. É essencial garantir que todas as pessoas tenham igualdade de oportunidades, proteção legal e reconhecimento da sua identidade e relacionamentos familiares.
Solicitamos ao Governo português que acione os meios diplomáticos junto do Governo italiano e da União Europeia para travar esta decisão e garantir que os direitos de parentalidade em famílias homoafetivas sejam plenamente reconhecidos.
A luta pela igualdade e pelos direitos das famílias arco-íris deve ser tratada com seriedade, e a discriminação legal e institucional precisa ser erradicada para garantir a proteção das crianças e a dignidade de todas as famílias, independentemente da sua composição. É imperativo que os sistemas judiciais na Europa e no mundo respeitem a diversidade familiar e reconheçam a importância da representação legal de todas as pessoas progenitoras e cuidadoras de toda e qualquer criança onde quer que esteja.